A proposta do governo Jair Bolsonaro de ampliar o escopo de escolas privadas sem fins lucrativos, como unidades religiosas; bem como aptas a receber dinheiro do Fundeb pode favorecer cidades mais ricas e drenar recursos de lugares mais pobres.
O efeito seria, portanto, o oposto do esperado com as novas regras do fundo, principal mecanismo de financiamento da educação básica pública, renovado neste ano.
O governo, com apoio de parlamentares da bancada religiosa, quer que escolas privadas sem fins lucrativos de toda educação básica (da creche ao ensino médio) possam receber verbas do Fundeb. Dessa forma, no momento é limitado a casos que não há vagas: educação infantil e especial e no campo.
Nesse modelo, escolas privadas sem fins lucrativos realizam convênios com as redes públicas; dessa forma, recebem recursos públicos, inclusive via Fundeb, com base nos alunos atendidos sem cobrar mensalidades. Atualmente, esses convênios no ensino fundamental estão concentrados em cidades mais ricas.
De acordo com o Censo Escolar do ano passado, 65% das matrículas da rede conveniada de fundamental; estão em cidades com os maiores IDHM (Índice de Desenvolvimento Humano Municipal). Por outro lado, apenas 2% das matrículas ficam nos municípios com os menores índices. Os dados foram tabulados pelo Movimento Todos Pela Educação.
Novo modelo
Dessa forma, ao levar em conta a presença de escolas filantrópicas não conveniadas; que potencialmente poderiam autobeneficiar. Com isso a concentração é ainda maior: 74% das matrículas estão em cidades com as maiores taxas do IDHM (entre 0,5 e 0,7).
O governo busca essa alteração na lei que vai regulamentar o novo Fundeb; cuja emenda constitucional, promulgada pelo Congresso neste ano, ampliou os recursos. O Fundeb direciona à educação básica recursos de uma cesta de impostos acrescidos de complementação da União.
O novo modelo prevê um salto da complementação da União dos atuais 10% para 23%; de forma escalonada, até 2026. Com um novo sistema de distribuição, esse dinheiro extra deve privilegiar cidades mais pobres.
Escolas confessionais, por exemplo, poderiam ser beneficiadas. Daí a pressão de religiosos, o que encontra ressonância com Bolsonaro e com o ministro da Educação, o pastor Milton Ribeiro –o ministro pouco se envolve no debate, mas disse a interlocutores que apoia a demanda.
O governo propôs um limite de 15% das matrículas privadas só para “vencer a resistência”, como consta em documento interno obtido pela reportagem.
A cidade de São Paulo; por exemplo, tem 305.833 vagas em creches conveniadas (83% da rede na etapa). Por outro lado, avaliações de órgãos de controle já mostraram atendimento precário; o modelo tem sido palco de uma indústria de irregularidades e desvios.
O IDH municipal é uma medida composta de indicadores de longevidade, educação e renda. Ele varia de 0 a 1 e, quanto mais próximo de 1, maior o desenvolvimento humano.
Fonte: Folha de S.Paulo