Pagar ao SUS é proposta “desbaratada”

O ex-ministro da Saúde (2007-2010), José Gomes Temporão, diretor-executivo do Instituto Sul-Americano de Governo em Saúde, classificou de desbaratada a ideia de cobrança no SUS, inserida num pacote do Senado encaminhado ao Planalto.

Temporão disse ter ficado em choque quando leu a notícia sobre o pacote:  “Quando vi a proposta, achei que estava delirando, voltando aos tempos da ditadura militar, com ideias desse tipo, como as de Leonel Miranda [ministro de 1967 a 1969], que propunha a privatização de toda a saúde brasileira”, disse o ex-ministro.

Para ele, projeto soa mais como uma provocação do governo em relação à saúde pública, pois a questão do financiamento da saúde pública necessita mudanças estruturais, tendo a ver com financiamento da seguridade social, com uma reforma fiscal e tributária, com imposto sobre grandes fortunas e sobre produtos que afetam negativamente a saúde pública, como fumo, bebidas, pesticidas, motocicletas.

A mesma posição tem o economista Carlos Ocké-Reis, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea),  que identifica na proposta mais um movimento no sentido da mercantilização da saúde pública no país. “Introduzir a prática de compra e venda de serviço dentro do SUS significa realinhar os incentivos econômicos dos prestadores. A literatura mostra que se acaba criando uma dupla porta e se oficializa uma qualidade diferenciada: quem paga tem acesso mais rápido e melhor dentro do sistema”, declara.

Co-pagamento só piora situação

Ocké-Reis, que é autor de “SUS, o Desafio de Ser Único (Fiocruz, 2012)”,  afirma que a experiência mostra que as políticas de co-pagamento são insuficientes e geram receitas irrisórias para o financiamento da saúde. O objetivo é refrear a demanda. É mais uma política de contenção de custos do que de apropriação de receitas.  Para ele, a cobrança é ineficaz como política de arrecadação e representa “um completo desastre para a equidade, pois amplia desigualdades”.

-O governo deveria entender a política de saúde como uma política anticíclica, fazendo com que as famílias gastassem menos com saúde, defende. Gasto público maior com saúde também ajudaria a reduzir a inflação do setor de serviços, com impacto na taxa total. Reduzir os gastos das famílias com saúde, por meio de oferta pública, é outra forma de ataque à inflação, ressalta.

Segundo o economista, ono país é cada vez mais concentrado, oligopolizado e internacionalizado. A taxa de retorno tem sido extremamente atrativa. Não é à toa que o governo recentemente abriu esse mercado. Há interesse das operadoras internacionais no Brasil.

De acordo com ele, entre 2003 e 2011, o lucro líquido na área cresceu duas vezes e meia em termos reais, já descontada a inflação. É um setor extremamente rentável, cuja margem líquida de lucro, no agregado, está entre 10% e 20%”, garante.

O ex-ministro Temporão, por sua vez, lembra  o fato de o custo privado ser a parcela maior no financiamento total da saúde. “É o contrário da Inglaterra, que tem um sistema universal, onde 85% do total são gastos públicos. Aqui 52% são privados. Isso afeta principalmente as famílias mais pobres, que têm que pagar para acesso a tratamentos e medicamentos que não conseguem obter na rede pública. Uma proposta desbaratada como essa da cobrança agrava essa situação”, ressalta.

 

Fonte:Gazeta do Povo/ Folhapress

A.V.

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Jorge Roriz

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