Bahia, ponto de encontro da humanidade

 

Aos jovens e queridos amigos Beatriz e vereador Henrique Carballal!

Na década de 1970, depois de muito refletir, chegamos à conclusão de que nunca houve uma guerra entre duas democracias. A beligerância, portanto, ocorreria quando pelo menos uma das partes envolvidas no conflito fosse uma ditadura, caracterizada pela intolerância com o enriquecedor diálogo que persegue desfechos capazes de harmonizar divergências. Extrapolamos o mesmo raciocínio para os indivíduos: para eclodir, os conflitos interindividuais teriam que contar com, pelo menos, uma pessoa intolerante, no plano familiar, societário, político, clubístico, acadêmico ou de outra natureza qualquer. Submetemos estas conclusões a historiadores, psicólogos e cientistas sociais que não nos apresentaram exceção a esta regra geral. Aproveitamos este espaço para ampliar aquele desafio.

Hoje, comparecemos com mais uma conclusão ousada, dessas fadadas a suscitar naturais questionamentos e, sobretudo, indiferença. Afinal de contas, os povos que vivem a reboque de nações matrizes desenvolvem a crença de que conclusões que sintetizem as grandes experiências humanas devem ser formuladas pelos centros detentores de poder hegemônico.

A conclusão que submetemos ao crivo da avaliação crítica dos leitores é a de que o povo baiano é o de formação mais complexa, em todo o Planeta, do ponto de vista cultural-ambiental, como genético.
Quando, na década de 1960 estava no auge a discussão para saber como se distribuíam as proporções dessas matrizes na formação dos humanos, enquanto diferentes estudiosos apresentavam percentuais de uma matriz e de outra, somando 100%, o Nobel de Medicina, de 1960, Peter Medawar, britânico nascido em Petrópolis, no Brasil, em 1915, encerrou a discussão, afirmando que os humanos resultam de uma participação de 100% do fator cultural e de 100% do fator genético. Com isso, Peter Medawar, que deixou o Brasil em 1933, aos dezoito anos, tornou evidente que cada indivíduo é o produto sinérgico da interação, por modos numericamente infinitos, do genético com o cultural, fazendo de cada um de nós herdeiro da tradição de uma via de percurso de toda a humanidade.

Muitos estudiosos concluem, entre eles Yung, que o incomparável talento poliédrico de Leonardo da Vinci seria explicável pela ressurgência nele de todo o acumulado genético cultural da humanidade, com predominância da herança dos gênios gregos. O Nobel em Biologia, Konrad Lorenz, por sua vez, em idêntica linha de raciocínio, explica a evolução intelectual dos animais, em geral, pela incorporação genética dos novos aprendizados.
Nós, os brasileiros, em geral, e os baianos, em particular, além de herdeiros da tradição greco-romana, pela via portuguesa, resultado do caldo cultural-genético europeu, com a participação, de permeio, de elementos asiáticos e médio-orientais, recebemos, ao chegarmos na Terra de Santa Cruz, a carga genética indígena e, logo depois, a africana, fato que nos eleva a um patamar de complexidade genético-cultural sem paralelo no Planeta.

Essa marcante e incomparável singularidade deveria ser permanentemente ressaltada como a nota distintiva de nosso contributo às Ciências Sociais, motivo potencial de atração de ponderáveis contingentes turísticos, a exemplo dos africanos e dos cinquenta milhões de negros dos Estados Unidos. Basta que se diga que o PIB produzido pela população negra norte-americana corresponde, aproximadamente, ao PIB brasileiro. Age bem o secretário de Turismo Fausto Franco, ao aprofundar o empenho para incorporar a negritude americana ao nosso fluxo turístico. É para falar desse e de outros assuntos correlatos que a renomada acadêmica Yeda Pessoa de Castro, ministra nos dias 6 e 7 de agosto vindouro, um curso na sede da Academia de Letras da Bahia, destinado a quem se interessar pelo tema.

É imperioso que os governos do Estado da Bahia e do Município de Salvador se compenetrem do dever irrenunciável de fomentar, continuamente, iniciativas que valorizem esse traço edificante do povo baiano no contexto da Humanidade.
A construção do Museu da Libertação na Chácara Boa Vista, no Engenho Velho de Brotas, que pertenceu a Castro Alves, se inscreve como prioridade, como as mais importantes entidades culturais da Bahia requereram ao Governador Rui Costa, em pleito que aguarda resposta.

Joaci Góes – Escritor e presidente da Academia de Letras da Bahia.

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