Este artigo tem por objetivo mostrar como a ciência e a tecnologia são utilizadas na guerra cibernética como uma das armas da guerra moderna e o que fazer para que sejam utilizadas exclusivamente em prol do bem estar da humanidade.

A guerra cibernética se apoia na tecnologia da informação e, modernamente, também nos avanços proporcionados pela inteligência artificial.

A cibernética é uma ciência de característica interdisciplinar tendo como base a pesquisa cientifica.

A cibernética como campo científico teve início durante a 2ª Guerra Mundial tendo como precursor Norbert Wiener que trabalhava na programação de computadores e nos mecanismos de controle para artilharia antiaérea.

O objetivo de Wiener com a cibernética era desenvolver pesquisas para criar um sistema artificial capaz de desenvolver funções até então essencialmente humanas, como, por exemplo, executar padrões de cálculos complexos, prever o futuro e a trajetória de uma aeronave.

Nesta época, Wiener se interessou pelo princípio do feedback e controle que consiste no uso de detectores que trabalhem como órgãos sensoriais e coletem informações sobre o desempenho das funções esperadas para determinado equipamento.

A guerra cibernética consiste, basicamente, no uso de ataques digitais para fins de espionagem ou sabotagem contra as estruturas estratégicas ou táticas de um país.

A espionagem visa roubar informações táticas e estratégicas como dados sobre a movimentação de tropas, os pontos fortes e fracos do sistema bélico do país e qualquer outra informação valiosa sobre recursos necessários para a guerra.

Na sabotagem, pode ir de uma ação simples como derrubar os servidores de um site governamental a algo extremamente nocivo como fazer o lançamento de uma ogiva nuclear.

A sabotagem se resume a “fazer algo” ao contrário da espionagem, que se resume a “descobrir algo”.

Na guerra cibernética, hackers com apoio do Estado, sejam membros das forças militares de um país, ou financiados por tal país, atacam computadores e redes de países oponentes que afetem recursos necessários para a guerra. Eles fazem isso da mesma forma que em qualquer outro computador ou sistema, isto é, estudam o sistema profundamente, descobrem suas falhas e usam essa falhas para controlar esse sistema ou destruí-lo.

Hackers podem usar informações confidenciais destinadas a outrem (espionagem) para ganhar a dianteira na batalha contra seu adversário.

Pode descobrir a velocidade de um míssil e construir outro míssil ou um avião que possa ultrapassá-lo. Pode descobrir para onde o inimigo está movendo suas tropas e planejar uma emboscada. Pode descobrir quais cientistas são importantes na criação dessas armas, ou qual político foi imprescindível na arrecadação de fundos para o tal sistema bélico e atacá-los diretamente com o uso, por exemplo, de drones.

Quando o país possui o controle desses sistemas, é possível, também, sabotar pessoas e estruturas.

Ao descobrir como as tropas estão se comunicando, o país ganha acesso à rede para que possa confundir o inimigo e invadir a base deles. Poderia invadir seus sistemas/contas e fraudá-los, se passando por um deles. Ou poderia usar essas informações para controlá-los e chantagear pessoas por causa de algo achado no computador ou sequestrar suas famílias usando informações privadas.
Destruir os sistemas de países inimigos tem um resultado óbvio: destrói o que controla esse sistema, e, consequentemente, impede-o de funcionar. Um exemplo comum de ciberguerrilha é o uso de ataques para desativar sites governamentais e redes sociais. Essa tática foi usada efetivamente pelos russos durante a Guerra da Ossétia do Sul em 2008, causando caos e espalhando informações falsas para a população antes e durante a invasão russa.

A guerra cibernética tem como alvo qualquer setor importante para a infraestrutura do inimigo. Isso significa setores como o exército, a defesa nacional e a indústria bélica. No entanto, esses alvos também podem ser fábricas de armas, minas e outras manufaturas que auxiliem no funcionamento dessas fábricas e o sistema elétrico, que fornece energia para todos esses setores.

Na sua versão mais assustadora, a guerra cibernética pode ter como alvo o recurso estratégico mais importante de um país que é sua população. Um hacker poderia fazer um ataque terrorista para desestabilizar ou desmotivar uma população a lutar. Isso implica em desencadear uma guerra financeira com ataques aos setores financeiros, que causariam danos econômicos ou ataques a sistemas de comunicação para desativar a rede de telefonia e a internet.

A guerra cibernética não faz nenhuma distinção entre alvos civis e militares. Apesar de um míssil causar um dano muito maior do que um vírus, um ciberataque pode resultar em perdas e mortes de civis. Se houvesse um ataque ao sistema energético de qualquer país e o sistema fosse destruído por um ciberataque não seriam só as fábricas de armas que parariam de funcionar. Um ataque desses resultaria também em acidentes de trânsito, cirurgias interrompidas, falhas em máquinas de suporte à vida quando uma quantidade elevada de pessoas poderia morrer.

É muito difícil descobrir o autor de um ciberataque nem os governos que financiam esses ataques. Um aspecto que faz as armas digitais piores do que as armas nucleares é o de descobrir quem fez o ataque. É muito fácil esconder a origem de um ataque desses mascarando a identificação do autor dos ataques. Mesmo que o governo descubra de qual computador o ataque foi efetivado, ainda existe a dificuldade de descobrir quem era a pessoa atrás da tela e é ainda mais difícil saber se ele era, ou não, um agente do governo.
Clausewitz afirmou que a guerra é um ato de violência para impor a vontade de um beligerante a seu inimigo.

O chinês Sun Tzu acrescenta que “a maior proeza militar é vencer sem combater”: a astúcia e a manipulação apresentam mais vantagens do que a agressividade para impor sua vontade sobre os outros. A guerra cibernética, definida com a utilização de meios para controlar países ou empresas, transforma radicalmente os três componentes históricos da guerra: a espionagem, a sabotagem e a guerra da informação, na linha observada por Sun Tzu.

Não existem dúvidas sobre o uso da capacidade cibernética com o objetivo de conseguir vantagem política, econômica e militar. Segundo se noticia, de um lado, China, Rússia, Irã e Coreia do Norte e, de outro, Estados Unidos, Israel, Reino Unido e França dispõem de meios cada vez mais sofisticados para obter informações de governos e de empresas para influir na vida das pessoas e destruir a infraestrutura e objetivos estratégicos de seus oponentes.

O mundo entrou numa fase de guerra permanente: sem frente de batalha e sem regras de engajamento. A guerra cibernética se assemelha à guerra insurrecional, com a diferença de poder planejar e executar a ação à distância, longe do inimigo. A utilização de algoritmos de inteligência artificial multiplicará o impacto das ações e criará no adversário novas vulnerabilidades. Será mais difícil a identificação de seus autores, pela utilização dos robôs para autorizar a difusão de falsas informações nas redes sociais ou para a disponibilização com livre acesso de algoritmos permitindo incluir pessoas em qualquer vídeo e de colocar em sua boca o que se deseje que ele diga.

É possível que já estejam acontecendo operações de espionagem cibernética, de sabotagem ou de influência comandadas de maneira completamente autônoma, necessitando apenas do sinal verde de alguém.

O entendimento de que a tecnologia 5G possa ser explorada para espionagem e sabotagem de instalações de infraestrutura, rede de comunicação e centros financeiros passou a ser uma nova preocupação e está na raiz da proibição da compra de produtos da Huawei para as redes 5G públicas ou privadas nos Estados Unidos.

A nova guerra fria entre os Estados Unidos e a China começou com o comércio, mas deve se deslocar rapidamente para a tecnologia, em que a China dá mostras de estar à frente de Washington nos avanços da aplicação da última geração 5G.

Tudo que acaba de ser relatado deixa bastante evidenciado que a ciência e a tecnologia estão a serviço não apenas da emancipação humana, mas também a serviço da guerra e da destruição da humanidade.

Na verdade a ciência e a tecnologia passaram a ser utilizadas para o bem e para o mal. A expectativa de que a ciência e da tecnologia seria utilizada exclusivamente para o progresso da humanidade foi dolorosamente interrompida por eventos que marcaram a sociedade atual sendo os principais deles sem dúvida às catástrofes da 1ª e da 2ª Guerra Mundial. Na verdade a ciência contribuiu para a barbárie de duas guerras mundiais com a invenção de armamentos bélicos poderosos e destrutivos e continua contribuindo para a sofisticação da guerra moderna.
Em sua obra A Dialética do Esclarecimento (Zahar Editora, 1985), Theodor Adorno e Max Horkheimer, filósofos vinculados à Escola de Frankfurt, afirmam que “coligadas, distantes dos indivíduos, capitalismo, ciência e tecnologia, fundidas agora como se fossem uma instância única, consolidam sua supremacia sobre a sociedade contemporânea, determinando seus rumos com a mesma desfaçatez e impessoalidade de uma mão invisível”.

Michael Lowy, sociólogo e filósofo franco-brasileiro e diretor de pesquisa em ciências sociais do CNRS- Centro Nacional de Pesquisa Científica da França, afirma que a barbárie moderna ou “barbárie gerada no seio das sociedades ditas civilizadas” se caracteriza pelo uso de meios técnicos modernos (industrialização do homicídio, extermínio em massa graças às tecnologias científicas de ponta), pela impessoalidade do massacre (populações inteiras – homens e mulheres, crianças e idosos – são “eliminados”, com o menor contato pessoal possível entre quem toma a decisão e as vítimas), pela gestão burocrática, administrativa, eficaz, planificada, “racional” (em termos instrumentais) dos atos bárbaros e pelo uso de ideologia legitimadora do tipo moderno: biológica, higiênica, científica (LOWY, Michael. Barbárie e modernidade no século 20. Publicado no Brasil pelo jornal “Em Tempo”- emtempo@ax.apc.org e, originalmente em francês, na revista “Critique Communiste” nº 157, hiver 2000).

Para fazer com que a ciência e a tecnologia sejam utilizadam para o bem da humanidade, é preciso acabar com as guerras que só ocorrerá se houver um Contrato Social Planetário que assegure o Estado de Bem Estar Social em cada país do mundo e a reestruturação da ONU que possibilite mediar os conflitos internacionais e assegurar a paz mundial. Com uma governança mundial através de uma ONU reestruturada e fortalecida será possível combater a guerra e acabar com o banho de sangue que tem caracterizado a história da humanidade ao longo da história. Os monumentos de Guerra devem ser substituídos por monumentos de Paz a partir da constituição de um governo democrático mundial.

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Fernando Alcoforado, 79, condecorado com a Medalha do Mérito da Engenharia do Sistema CONFEA/CREA, membro da Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de Barcelona,http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2010), Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e combate ao aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica,
Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011), Os Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba, 2012), Energia no Mundo e no Brasil- Energia e Mudança Climática Catastrófica no Século XXI (Editora CRV, Curitiba, 2015), As Grandes Revoluções Científicas, Econômicas e Sociais que Mudaram o Mundo (Editora CRV, Curitiba, 2016), A Invenção de um novo Brasil (Editora CRV, Curitiba, 2017), Esquerda x Direita e a sua convergência (Associação Baiana de Imprensa, Salvador, 2018, em co-autoria) e Como inventar o futuro para mudar o mundo (Editora CRV, Curitiba,

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