O dia 20 de outubro é lembrado pelo Dia Mundial de Combate ao Bullying. Esta data é importante para a conscientização, prevenção e enfrentamento desse problema que atinge crianças e adolescentes no mundo todo, afetando a saúde física, a saúde mental e também o desenvolvimento comportamental e educacional de um jovem
Cerca de 5 a 10% dos adolescentes submetidos a otoplastias sofrem bullying por terem orelhas “de abano”
Adolescentes que sofrem bullying, em algum momento da vida, tendem a demonstrar um interesse maior em realizar cirurgias plásticas. É o que aponta uma pesquisa conduzida pelo Dr. Dieter Wolke, da Universidade de Warwick, no Reino Unido.
O estudo analisou cerca de 2.800 adolescentes britânicos entre 11 e 16 anos, sendo que 752 estavam diretamente envolvidos em episódios de bullying. Os resultados mostraram que, ao todo, 31% dos jovens que sofrem bullying têm um desejo extremo de fazer cirurgia plástica.
Segundo Danielle H. Admoni, psiquiatra geral e da Infância e Adolescência, pesquisadora e supervisora na residência de Psiquiatria da UNIFESP; a busca por cirurgia plástica entre as vítimas de bullying tem uma importante relação com baixa autoestima, necessidade de aceitação social e problemas psicológicos decorrentes das agressões.
“Quem sofre bullying acredita que mudar a aparência física vai melhorar sua autoestima e suas relações sociais. No entanto, esses procedimentos não vão tratar as feridas emocionais”, alerta Admoni, especialista pela ABP (Associação Brasileira de Psiquiatria).
Em referência ao Dia Mundial do Combate ao Bullying, em 20 de outubro, saiba o que motiva as vítimas adolescentes a fazer cirurgias plásticas e quais as limitações.
Quais os procedimentos mais procurados: dados da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica revelam que, no Brasil, 6,6% das plásticas são realizadas em jovens de até 18 anos. Nos últimos 10 anos, o país registrou aumento de 141% no número de procedimentos no público entre 13 e 18 anos.
Segundo Luís Maatz, cirurgião plástico, especialista em Cirurgia Geral e Cirurgia Plástica pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (HC/FMUSP); as cirurgias plásticas mais procuradas por adolescentes que sofrem bullying geralmente estão relacionadas a características físicas que costumam ser alvo de comentários negativos ou provocações.
“Esses procedimentos são mais comuns entre adolescentes na faixa etária de 13 a 18 anos, sendo que o interesse por cirurgias plásticas aumenta à medida que os jovens se aproximam da idade adulta”, completa o membro da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP), e cirurgião de Reconstrução Mamária no Hospital Sírio-Libanês.
Rinoplastia (cirurgia no nariz): segundo dados da American Society of Plastic Surgeons (ASPS), a rinoplastia corresponde cerca de 45% das cirurgias plásticas realizadas em adolescentes entre 15 e 19 anos, especialmente aqueles que sofrem provocações devido ao formato ou tamanho do nariz
Segundo Maatz, a partir dos 16 anos, as estruturas ósseas e cartilaginosas do nariz e da face, por exemplo, já estão totalmente desenvolvidas. “Mesmo assim, o ideal é que a rinoplastia seja feita somente em casos justificáveis. Para meninas, o indicado é realizar a plástica entre 15 e 17 anos. Para os meninos, entre 17 e 19 anos”.
Otoplastia (cirurgia nas orelhas): cerca de 5 a 10% dos adolescentes submetidos a otoplastias sofrem bullying por terem orelhas “de abano”. “As orelhas param de crescer entre cinco e seis anos. Portanto, se o jovem estiver sofrendo bullying, o que pode atrapalhar seu desenvolvimento social e emocional, a cirurgia pode ser feita nessa faixa etária”, explica Maatz.
Lipoaspiração: o número de adolescentes que se submetem à lipoaspiração é relativamente baixo em comparação à rinoplastia ou otoplastia. Segundo a ASPS, cerca de 4 a 5% das cirurgias plásticas realizadas em adolescentes estão relacionadas à lipoaspiração, embora o procedimento seja indicado a partir dos 18 anos.
Cirurgia de mama (redução ou aumento): assim como a lipoaspiração, as cirurgias envolvendo as mamas devem ser feitas após os 18 anos. A redução de mamas, por exemplo, é considerada necessária quando o tamanho compromete a respiração ou causa danos à coluna.
Já o aumento de mama (com implantes) é uma opção considerada por jovens que sentem insatisfação com o tamanho dos seios, especialmente em casos de assimetria. “A escolha do tamanho das próteses deve considerar a proporção do tórax, peso, altura e elasticidade da pele”, diz Luís Maatz.
O que deve ser levado em conta: segundo Claudia Petry, especialista em Educação para a Sexualidade e Educação Sexual Infantil pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC/SC), além de professora no Instituto de Parapsicologia e Ciências Mentais de Joinville (SC); a construção da autoestima na adolescência é influenciada pelo que o jovem ouve dos colegas e vê nas redes sociais.
“Quando essa construção é abalada por agressões verbais e físicas, como ocorre no bullying, há uma tendência de querer adequar-se a um padrão estético irreal, levando jovens a tomarem decisões precipitadas sobre mudanças no próprio corpo, submetendo-se a riscos físicos e psicológicos desnecessários”.
Daí a importância de fazer o jovem se questionar: a cirurgia plástica é por você ou pelos outros? “A ideia de alguém fazer uma plástica para evitar o bullying é preocupante. Afinal, o problema está no bullying, e não no nariz da pessoa”.
A especialista lembra ainda que a adolescência é uma fase importante de alterações físicas e hormonais. “A mamoplastia, por exemplo, deve ser feita apenas quando as mamas atingirem seu tamanho final. Entre as adolescentes com sobrepeso ou obesidade, esse tempo pode ser prolongado, já que essas jovens tendem a apresentar um desenvolvimento mamário mais tardio”, diz Petry, também especialista em Sexualidade Feminina e Ginecologia pela Faculdade de Medicina da USP (FMUSP).
Outro fator importante é a maturidade emocional e psicológica do adolescente. “É fundamental que o jovem compreenda totalmente os impactos da cirurgia, como possíveis cicatrizes ou riscos de complicações, garantindo expectativas realistas ao optar por qualquer procedimento”, esclarece Claudia Petry.
Todo adolescente pode fazer plástica? Segundo Danielle Admoni, a cirurgia não é recomendada para jovens com diagnósticos de transtorno dismórfico corporal, transtornos de humor, de personalidade, dissociativos, entre outros.
“Ou mesmo para aqueles com expectativas não realistas, ideais que fogem do padrão estético normal. Daí a importância de pais e responsáveis estarem atentos e buscarem compreender o que tanto incomoda o adolescente a ponto de querer se submeter ao procedimento”, reforça Admoni.
Segundo Maatz, o ideal é que as cirurgias plásticas na adolescência sejam discutidas entre o clínico geral, o cirurgião plástico e um especialista em saúde mental.
“O objetivo é obter um julgamento cirúrgico adequado, devendo ser valorizados aspectos como a idade ideal para o procedimento, o estado de saúde, a inserção social, a vulnerabilidade emocional associada ao bullying, a autoestima e a autoimagem do jovem”, finaliza Luís Maatz.